Filme Cisne Negro e os
Arquétipos
O filme Cisne Negro mostra um dos mitos mais recorrentes em
diversos panteões: O Mito de Descida.
O Mito de Descida fala sobre o encontro com a nossa sombra,
uma de nossas facetas, e também nosso processo de individuação e o ciclo
vida-morte-vida. Na Suméria, foi a Deusa Inanna (deusa da vida e da
fertilidade) que desceu ao Submundo para encontrar a Deusa Ereshkigal (deusa da
morte, rainha do inferno). Na mitologia grega temos o rapto de Core (a jovem, a
virgem). Neste mito, o Deus Hades, fascinado pela beleza da jovem, leva-a para
o mundo subterrâneo, desposando-a e fazendo dela sua rainha e esposa (Perséfone,
Rainha do Submundo).
Return
of Persephone – Frederic Leighton
No filme, Nina (Natalie Portman),
uma bailarina, representa Core (menina pura, virginal, graciosa, submissa e ingênua) em seu
processo de descida. O processo está inconsciente até ela conseguir o papel
principal da peça “O Lago dos Cisnes” e ter que representar os dois cisnes
(branco e negro) e se deparar com a grande dificuldade em interpretar o Negro,
pois ele representa o ser Rainha da própria vida, se tornar mulher, o se
desvincular de sua mãe e lidar com a Sombra.
Assim como no mito, Nina possui
uma mãe (Erica) que a protege e mima, além de projetar nela a sua carreira não realizada. Ela
controla a filha e a sufoca, não deixando-a amadurecer e andar pelas próprias
pernas. Essa mãe (arquétipo de Deméter) está atuando no lado sombra, pois o
papel de nutridora e doadora de vida ultrapassa e atua no lado controlador e
manipulador. A mãe vê que sua filha não é mais uma menina (Core), e tenta de
todo jeito mantê-la nesse estado. O quarto é cheio de bichinhos de pelúcia,
caixinha de música, ela coloca-a pra dormir, penteia o cabelo e faz tudo para
Nina. Ela começa a se frustrar quando vê que está perdendo o controle.
O diretor artístico da academia
(Thomas) é o arquétipo de Hades, que a seduz e faz com que a sexualidade dela
desabroche. Ele rapta-a psicologicamente. Ele percebe que Nina é assexuada,
inibida, timida e que a rigidez interna dela impede
que sua dança flua. Ele estimula Nina a pensar em sexo. Ele também a beija e a
toca.
A nova amiga da academia, Lily, é
o arquétipo de Afrodite. Mulher livre, dona de si, com sexualidade bem
resolvida. Ela é criativa, alegre e dança de forma despretensiosa. Quando Nina
se depara com isso, se sente ameaçada, pois ela pode tomar o seu lugar. E ela,
ainda como Core, vê que não recebe mimos na academia como em casa, com sua mãe.
O mundo é cruel. Nina também não sabe como lidar com o Cisne Negro que começa a
florescer dentro dela (rapto de Hades).
O ápice do rompimento se dá no
momento em que ela enfrenta sua mãe e sai para dançar com sua amiga Lily, sem
culpas, de forma libertadora.
A descida realmente acontece
quando ela se descobre como mulher, se toca, sente prazer, se entrega, se
liberta, tem fantasias. O Cisne Negro desperta e no filme mostra Nina com asas.
No fim do filme, Nina integra o
Cisne Branco com o Cisne Negro (Core e Perséfone – Virgem e Rainha) quando se
entrega ao processo e deixa fluir, vivencia os dois lados, tem a luta dela com ela mesma no camarim onde quebra o reflexo no espelho e depois no palco ela fala: Foi perfeito! A
perfeição não está ligada a rigidez e controle. A perfeição é a integração da luz e sombra
de forma consciente. É ser o que se é, é reconhecer as nossas facetas e
vivencia-las em plenitude.
A morte no final é mais uma morte
simbólica, no sentido de que Nina deixa um estado para outro. Ela integra as
duas facetas. Em todo processo de descida deixamos algo para trás, algo morre
para dar lugar a outra coisa, outro estado. São os ciclos de vida-morte-vida,
as transformações.
©Texto de Ana Karina Lunelli. Diga
não ao plágio. Gratidão.
2 comentários:
Parabéns, Ká! Ótimo texto!!
Obrigada Mô! ;)
Beijos!
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